Os diferentes prismas de análise da compra e venda

Há alguns anos, acompanhamos a operação de aquisição de uma empresa brasileira, produtora de equipamentos médicos, alvo de uma concorrente multinacional que não detinha planta produtiva no Brasil. Cerca de um ano antes da concretização da operação, o fundador da empresa brasileira contratou o valuation a uma consultoria renomada, que aplicou a metodologia de fluxo de caixa descontado, como recomendam as boas práticas. Pelas condições de mercado e da própria empresa à época da análise, o resultado da valoração do negócio foi algo em torno de 6,5 vezes o EBITDA. Nada excepcional, mas um bom número.

Passados alguns meses, a ANVISA, órgão regulador do setor, editou uma resolução que dificultava sobremaneira a importação de produtos concorrentes, fazendo com que as multinacionais que traziam seus produtos de plantas, fora do Brasil, passassem a analisar seriamente a possibilidade de iniciar suas operações fabris localmente. Como consequência, bateram à porta da tal empresa que havia sido avaliada e lhes propuseram a aquisição por múltiplos da ordem de 20 vezes o EBITDA, antes mesmo que o empresário dissesse quanto esperava receber pelo seu ativo.

O caso ilustra bem o desafio da valoração dos negócios. A percepção de valor da companhia multinacional foi definida por um cálculo que não tinha nada a ver com a capacidade de geração de caixa operacional da empresa-alvo, mas sim, pelo cálculo de quanto ela, a empresa adquirente, deixaria de auferir de ganhos, caso ela não se enquadrasse na posição de produtora nacional, em atendimento à nova regulação emitida pela ANVISA. Assim, era vantajoso pagar um múltiplo exorbitante pela fabricante nacional e seguir explorando fortemente o mercado brasileiro a partir de sua planta local.

O caso exemplificado demonstra o impacto dos diferentes prismas de análise de comprador e vendedor de um ativo na hora de fazer a valoração dos negócios

Que tal expandirmos essa mesma análise para o conjunto dos stakeholders do mercado de Fundos de Investimentos em Participações (FIPs)?

No próximo artigo, falaremos sobre os atores centrais do mercado de FIPs sob a ótica da Instrução CVM 579.

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Marcus Lindgren

Managing Partner da Moore Belo Horizonte
marcus@moorebrasil.com.br